Liberdade acadêmica sob ataque

Artigo recente destaca que riscos à autonomia universitária têm crescido no mundo

Conservadores, no mundo todo, reclamam com frequência que o ambiente acadêmico é majoritariamente de esquerda e frequentemente hostil aos seus posicionamentos. Progressistas, por sua vez, têm cada vez mais denunciado tentativas de censura por parte de governos e grupos organizados de extrema-direita. O tema é polêmico, e costuma ser debatido muito mais a partir de casos isolados e impressões pessoais do que baseado em evidência empírica.

Uma pesquisa com universitários, realizada pelo Instituto Sivis, traz um pouco de objetividade ao tema no Brasil. Divulgada em reportagem de Caio Sartori há dois domingos no GLOBO, o estudo mostra que há mesmo predominância de identificação com a esquerda entre universitários, com 47% dos entrevistados assim se declarando. Aqueles que se dizem, em algum grau, como de direita somam 26%, enquanto os de centro representam 17%.

O levantamento revelou que quase metade (48%) dos estudantes disse ter evitado, nos últimos 12 meses, debater algum assunto controverso ou polêmico em sala de aula ocasionalmente, muitas vezes ou sempre. No debate público, conservadores e progressistas são os que mais se acusam mutuamente pelo ambiente hostil à liberdade acadêmica, mas são os estudantes de centro aqueles que mais dizem sofrer autocensura (52%). O percentual entre estudantes de esquerda (44%) é ligeiramente superior aos de direita (39%), mas o fato é que os patamares são preocupantes em todos os grupos.

Outro dado inquietante da pesquisa é o fato de apenas 52% dos universitários serem considerados democratas consistentes, ou seja, aqueles que não apenas dizem preferir a democracia, mas também rejeitam qualquer tipo de flexibilização de seus princípios. Uma parcela relevante (40%), apesar de dizer que a democracia é preferível, aceita que, numa situação de crise, o governo passe por cima de leis, do Congresso ou das instituições com o objetivo de resolver problemas e melhorar a vida da população. E outros 8,6% são declaradamente autoritários mesmo.

Em recente artigo (“Professors are the Enemy: two faces of academic freedom”), publicado em julho deste ano, a cientista política Pippa Norris, da Harvard Kennedy School, destaca que riscos à autonomia universitária vêm crescendo ao longo deste século no mundo. Suas pesquisas confirmam que países autoritários reprimem mais a liberdade acadêmica, mas ela destaca que a ameaça vem aumentando também em democracias outrora consideradas sólidas, caso dos Estados Unidos, num fenômeno associado à própria crise das democracias liberais.

Reproduzido do O Globo. Confira a publicação original.

Por Antonio Gois.

Veja também

Contato da Imprensa: [email protected]