Nos últimos meses, uma série de decisões preocupantes colocou em risco o futuro da liberdade de expressão global. Na Turquia, quatro jornalistas foram presos por publicarem uma caricatura do profeta Maomé. Na Índia, o governo impôs o bloqueio de mais de 8 mil contas voltadas à comunidade muçulmana na plataforma X. Já no Brasil, o STF decidiu, na semana passada, pela inconstitucionalidade parcial do artigo 19 do Marco Civil da Internet – com isso, plataformas digitais podem ser responsabilizadas legalmente por conteúdos de usuários, mesmo sem ordem judicial.
Esses eventos ilustram um fenômeno já apontado por agências que medem a qualidade das democracias no mundo, como o V-Dem. Hoje, países democráticos são minoria. Além disso, a liberdade de expressão está em declínio em mais de um quarto do mundo. Vivemos em uma realidade marcada pelo avanço das tecnologias de comunicação de massa e, ao passo que elas facilitam a circulação de pensamentos e ideias, também aumentam o alcance de críticas, sátiras e desinformação. Diante disso, muitos governos têm, cada vez mais, restringido o direito à expressão, como uma forma de enfrentar os desafios trazidos por esse novo cenário.
A censura, entretanto, não é um fenômeno recente. O professor Jacob Mchangama traz este argumento em seu livro, intitulado Liberdade de Expressão: de Sócrates às mídias sociais, traduzido para o português pelo Instituto Sivis. Como o próprio título sugere, na Grécia Antiga, Sócrates foi condenado à morte por envenenamento, acusado de introduzir novas divindades e corromper a juventude. O motivo real da condenação, no entanto, era o pensamento crítico de Sócrates, que desafiava a ordem moral da sociedade e as autoridades existentes.
A liberdade de expressão é a primeira e a mais fundamental das liberdades. É através dela que o povo exerce sua soberania, por meio da participação no debate público. Ela também impede que qualquer autoridade abuse do poder em nome de interesses próprios, garantindo o accountability dos representantes. É justamente graças a sua tamanha importância que a liberdade de expressão é, também, uma das primeiras a serem cerceadas em regimes autoritários.
Neste cenário mundial de retrocessos democráticos, portanto, a jornalista e palestrante Madeleine Lascko, colunista na Gazeta do Povo, afirma no prefácio do livro que “a liberdade precisa ser defendida com a mesma energia com que foi conquistada”. Não podemos considerar o direito à expressão como algo garantido. Na realidade, ela está sempre sob constante ameaça.
Pensando nisso, o Instituto Sivis está promovendo, em parceria com a Faculdade Belavista, em São Paulo, uma Masterclass sobre liberdade de expressão. O evento está contando com quatro especialistas no tema, Ana Luiza Braga (Belavista), Carlos Affonso Souza (ITS-Rio), Fernando Schüler (Insper) e, inclusive, o próprio Jacob Mchangama. Na ocasião, haverá também o lançamento da versão em português do livro de Mchangama, Liberdade de Expressão: de Sócrates às mídias sociais, prefaciado por Madeleine Lacsko e traduzido pelo Instituto Sivis. O evento busca informar e capacitar jornalistas, juristas e estudantes sobre a necessidade da proteção da liberdade de expressão, sobretudo quando ela vem sendo tão atacada.
A liberdade de expressão é um dos principais pilares de uma democracia saudável. Por isso, é urgente que mais espaços de debate sejam realizados com o objetivo de fortalecer esse valor.
Reproduzido da Gazeta do Povo | 15/07/2025 | Por Fernanda Trompczynski, estagiária de pesquisa no Instituto Sivis.