17/07/2025
Americano ultrapassa limites da soberania internacional ao sancionar o Brasil, mas sua crítica sobre liberdade de expressão merece consideração
Na última semana, o debate global sobre liberdade de expressão ganhou contornos ainda mais sérios e preocupantes. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou a imposição de uma taxa de 50% sobre as importações de todos os produtos brasileiros, gerando apreensões sobre a economia nacional, já que os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil.
Como justificativa, Trump citou os “ataques insidiosos” aos “direitos fundamentais de expressão dos americanos”, referindo-se às decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a responsabilização de plataformas de mídia social pelos conteúdos publicados, definidas a partir do julgamento sobre a inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet.
É preciso ter clareza sobre o equívoco de Trump: não se pode sancionar um país com base em suas decisões judiciais e leis internas. Nenhuma nação pode se arrogar o direito de intervir na soberania de outra, nem mesmo sob o pretexto de “defesa da liberdade de expressão”.
A Carta das Nações Unidas, documento assinado tanto pelo Brasil quanto pelos Estados Unidos, estabelece através do artigo 2º que todos os Estados possuem igual soberania no âmbito internacional, vedando a interferência externa em questões essencialmente relativas à jurisdição interna de cada país.
Contudo, o erro de Trump não invalida um debate legítimo. Como garantir o direito à liberdade de expressão em um ambiente marcado por desinformação, polarização e ausência de legislações com critérios objetivos? O Brasil passa por um momento delicado, no qual o combate à violência digital e à desinformação tem se confundido com práticas autoritárias.
A ação paternalista do STF levanta questionamentos legítimos, inclusive no exterior, sobre os limites entre regulação e censura. Em meio a esse cenário, destaca-se a importância de espaços plurais de debate, como a Masterclass de Liberdade de Expressão, promovida pelo Instituto Sivis em parceria com a Faculdade Belavista, entre os dias 14 e 17 de julho, em São Paulo.
O evento contou com a presença do advogado e professor Jacob Mchangama, referência mundial no tema, que realizou duas palestras e participou do lançamento da versão em português de seu livro Liberdade de Expressão: de Sócrates às Mídias Sociais. Sobre a questão, Mchangama observa: “é um erro grave quando instituições em países enfrentando polarização pensam que a liberdade de expressão é a causa, em vez de um reflexo do colapso da confiança”.
Além dele, a Masterclass reuniu outros especialistas renomados, como Ana Luiza Braga (advogada e professora na Faculdade Belavista), Carlos Affonso Souza (diretor do ITS-Rio) e Fernando Schüler (professor do Insper e colunista da revista Veja), para discutir temáticas como os desafios tecnológicos e jurídicos do debate público na era digital.
É fundamental compreender que defender a liberdade de expressão não significa compactuar com discursos nocivos. Pelo contrário, sua proteção garante os meios para contestá-los de forma democrática, transparente e racional. Isso só é possível quando os poderes do Estado atuam com responsabilidade, dentro de limites claros e com accountability.
Ao sancionar o Brasil, Trump ultrapassa os limites da soberania internacional. Entretanto, a questão que motiva sua crítica merece consideração. Democracias fortes não se perpetuam a partir da imposição de silêncio, mas sim, do debate aberto e plural.
Por isso, esperamos que a Masterclass seja um convite ao diálogo construtivo e um lembrete de que a liberdade começa na palavra e se consolida na responsabilidade democrática.